Vida a dois: sem espaço para filhos!
Cada vez mais casais estão optando por não aumentar a família. Motivos vão desde alto custo de vida à escolha por “liberdade”
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As fotos da família revelam uma nova dinâmica na sociedade. Se nas décadas de 70, 80 e 90, os registros do dia a dia dos lares eram repletos de crianças, hoje, as fotos de famílias sem crianças e adolescentes estão cada vez mais comuns. Para boa parte das novas gerações, não há espaço para filhos.
É o caso da arquiteta Ana Carolina Zanetti Campanharo, 31, e do empresário Bernardo Muniz, 47. Casados há quatro anos, eles optaram por não ter filhos e, há dois meses, adotaram a cachorrinha Dara, que hoje é a queridinha da família. Ana Carolina explica que ao olhar amigas com filhos, observa como a rotina é impactada.
“Eu não me vejo parada em casa para cuidar de um filho. Gosto da liberdade de ter horário de dormir e de acordar, de viajar, de sair e de trabalhar. Não pensamos em ter filhos porque é algo que exige muita dedicação. Recentemente, adotamos a Dara e estamos muito felizes com a nossa família”.
O economista e pós-doutor em Geografia Urbana Cimar Aparicio analisa que há várias situações que explicam o aumento dos arranjos familiares sem filhos. O adiamento da transição para a vida adulta, quando jovens saem da casa dos pais, é um dos fenômenos principais, por exemplo.
“Eles preferem ter filhos mais tarde. Este é um fenômeno que tem ocorrido nas regiões metropolitanas brasileiras, como São Paulo, Rio de Janeiro e Vitória. Existe, sim, a situação dos casais que não desejam ter filhos, mas essa não é a situação predominante na dinâmica familiar latino-americana e brasileira”.
Estudos apontam que é crescente o número de pessoas, especialmente nascidas a partir de meados dos anos 80, que não desejam ter filhos, aponta o doutorando em Ciências Sociais e sociólogo Carlos Lopes.
O pesquisador explica alguns motivos pessoais que influenciam nesse fenômeno.
“A falta de tempo dos casais para dedicação aos filhos, sobretudo em razão das jornadas de trabalho, a priorização da carreira profissional do casal, os traumas e experiências ruins nas relações parentais vivenciadas diretamente pelos casais e a escolha pelos prazeres da vida, como viagens e liberdade de horários, são motivos que explicam o cenário”.
Insegurança com futuro influencia
O desejo de um casal por ter filhos é confrontado por um cenário pouco animador: violência urbana, alto custo de vida nas grandes cidades e empregabilidade precária. De acordo com especialistas, a insegurança com o futuro influencia os planos de aumentar a família entre os casais.
A mudança, inclusive, é mundial. Um estudo publicado na revista britânica The Lancet demonstrou que, até 2100, apenas os países Samoa, Tonga, Nigéria, Chade e Tajiquistão, entre 204, terão níveis sustentáveis de nascimentos para reposição da população.
O futuro incerto do ponto de vista econômico, com os empregos e a estabilidade profissional ameaçados, influencia a decisão dos casais em não terem filhos, aponta o doutorando em Ciências Sociais, sociólogo e pesquisador Carlos Lopes.
“O aumento do custo de vida nas cidades e as exigências e gastos cada vez maiores para criação e educação formal dos filhos, bem como o sentimento de crescimento nos índices de violências, criminalidade e guerras, compõem o cenário que contribui significativamente na tomada de decisão de não ter filhos”.
O economista e pós-doutor em Geografia Urbana Cimar Aparicio reitera que fatores socioeconômicos influenciam a decisão dos casais em ter filhos.
“Os cenários de crise econômica e social podem desestimular os casais a terem o primeiro ou o segundo filho. Ou os casais adiam tanto a fecundidade que, quando desejam, é complicado devido ao término da idade reprodutiva da mulher”.
No Brasil, a taxa de fertilidade, em 1950, era de 5,93 filhos. As expectativas futuras apontam que a taxa será de 1,57, em 2050, e de 1,31, em 2100.
Saiba mais
Natalidade
- 19% das famílias não têm filhos no Brasil.
- Em 1999, essa taxa era de 13%.
Nas últimas décadas, a taxa de nascimento está em queda. Especialistas apontam que o fenômeno já foi observado, primeiramente, nos países desenvolvidos. Agora, nas sociedades emergentes, a queda da natalidade se torna uma realidade.
A baixa natalidade tem sido puxada pelos novos padrões familiares nas últimas décadas, com redução gradual e significativa do número de filhos, incluindo a decisão de alguns casais de não tê-los.
A taxa de fertilidade brasileira, em 1950, era de 5,93 filhos. Em 2050, expectativas sugerem que a taxa será de 1,57, diminuindo para 1,31 em 2100.
Motivos
Diversos fatores sociais, econômicos e culturais influenciam o crescimento dos lares familiares sem crianças ou adolescentes. A vulnerabilidade da empregabilidade, o crescimento da escolaridade média, o alto custo de vida das sociedades urbanas e os problemas relacionados à violência urbana estão entre as principais causas do fenômeno.
As crises econômica e social também podem desestimular os casais a terem o primeiro filho. Além disso, a criação e a educação formal dos filhos estão mais caras.
Há, ainda, o maior acesso à educação sexual, ao planejamento familiar e à democratização do acesso aos métodos contraceptivos, além do empoderamento feminino e da entrada da mulher no mercado de trabalho.
Hoje, com homens e mulheres no mercado de trabalho, sobra pouco tempo para a educação de um filho. Há, ainda, casais que priorizam o crescimento profissional a ter uma criança.
A valorização dos prazeres individuais da vida, como a disponibilidade de viajar, de sair à noite e o controle dos horários da rotina, também influenciam a opção dos casais em não ter filhos.
Fonte: IBGE e especialistas consultados.
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