“Rei das perucas”, ex-militar ajuda mulheres com câncer
Empresário do ramo da beleza, Dirceu Paigel, de 62 anos, abandonou a carreira na Polícia Militar e hoje trabalha como cabeleireiro
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“Quando crescemos em uma cidade do interior, não há tantas opções do que se fazer profissionalmente. Sou de Barra de São Francisco, de uma família simples, e, quando iniciei a vida profissional, fui influenciado pelo que todos me diziam. Eu me tornei policial militar e, depois, abandonei a carreira para seguir o sonho de ser cabeleireiro e peruqueiro.
Para muitos, essa transição profissional seria muito conflituosa, tanto interna quanto externamente, já que a família pode ser um peso nesses momentos. Não foi o meu caso. Quando resolvi mudar e seguir um outro destino, encontrei um propósito e envolvi toda a minha família no meu ofício. Sem eles, eu não conseguiria fazer o que faço.
Carreira militar
Entrei na carreira militar aos 22 anos. Não tinha nada para fazer e, no imaginário social da época, passar no concurso para a Polícia Militar era extremamente difícil. Lembro que fiz a prova para me testar e nem esperava um bom resultado, mas fui surpreendido quando descobri que conquistei uma vaga.
Me mudei para Colatina e, durante dois anos, fui policial militar. Naquela época, a instituição era outra. Hoje, fala-se mais sobre uma atuação humanizada.
Como militar, me sentia útil, participativo e capaz. Tenho orgulho de ter passado no concurso e atuado na área, mas logo tive conflitos: não aceitava a ideia de um policial grosso e que achava que podia tudo. Bati muito de frente com outras pessoas. No fim, vi que a carreira não era para mim e decidi me mudar para Vitória para ampliar minha visão de mundo.
Mudança de vida
Não houve um acontecimento marcante que me fez mudar de carreira. Para ser honesto, eu não me sentia pertencente à instituição.
Quando vim para Vitória, não fazia ideia do que faria. Um dia, fui chamado para auxiliar na lavagem de cabelos em um salão de beleza. Foi ali que, já no primeiro momento, percebi que eu gostava daquilo e que poderia construir uma carreira. Nasceu um sonho.
Trabalho há 40 anos no mercado da beleza, e, hoje, sou bem-sucedido. Sou muito mais feliz ao levantar para trabalhar.
Com o decorrer dos anos, abri meu próprio salão e comecei a produzir perucas. Estou em uma área mais sensível: trabalho com pacientes em quimioterapia. Faço a doação para os hospitais de tratamento do câncer na Grande Vitória.
As perucas arrancam sorrisos e alegria nos olhares das minhas pacientes. Com elas, consigo levar um pouco mais de esperança e de conforto em meio a momentos tão difíceis para se enfrentar na vida.
Sou o único mantenedor do Hospital Evangélico de Vila Velha, por exemplo. O trabalho social está nas minhas veias: minha família, mesmo com poucas condições, sempre foi engajada em ajudar ao próximo.
A partir do momento em que eu comecei a trabalhar com perucas, eu vi ali a possibilidade de fazer a diferença. Construímos autoestima, resiliência e confiança para essas mulheres. Passamos a fazer parte da vida delas, já que nos envolvemos em um momento muito delicado do tratamento.
Muitas das minhas pacientes precisam de um olhar mais sensível, de uma conversa e de empatia. Para muitas, eu me torno até um tipo de ‘psicólogo’, se me permite dizer assim. Elas compartilham a rotina do tratamento, os sentimentos mais presentes, os medos, as conquistas e as aspirações.
Vim de uma família extremamente pobre e encontrei um propósito que me motiva e me faz ganhar a vida. Sou muito grato a Deus por ter sido tão generoso comigo.
Conselho
Costumo dizer aos meus funcionários que nunca temos que fazer aquilo que não gostamos.
Muitas vezes, isso se reflete emocionalmente e, em algumas pessoas, até provoca depressão. Não precisamos ter medo de mudar, de investir em uma nova profissão e de buscar novos sonhos.
Sou o exemplo disso. Quando descobri um sonho e lutei por ele, me tornei um profissional de sucesso e completamente realizado com o que faço”.
Depoimento concedido ao repórter Jonathas Gomes.
Quem é?
Dirceu Paigel, de 62 anos, é cabeleireiro e peruqueiro. Empresário do ramo da beleza, ele possui uma rede de salões com lojas no Shopping Vitória e na Galeria Tiffany, ambos na capital.
Além disso, faz perucas e as fornece para pacientes em quimioterapia nos hospitais Santa Rita, em Vitória, e Evangélico, em Vila Velha.
Iniciou a carreira como policial militar e, após dois anos de atuação, deu uma guinada na vida profissional e descobriu a vocação para a área da beleza.
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