Menino indígena de 7 anos é salvo por médicos do ES
Garnison Kaxuyana Tiriyo estava com insuficiência cardíaca causada por febre reumática e passou por cirurgia em Vila Velha
Escute essa reportagem
A falta de ar e o cansaço extremo devido a um quadro grave de insuficiência cardíaca agora se transformaram em sorrisos, ainda tímidos, do pequeno Garnison Kaxuyana Tiriyo, de 7 anos.
Sem falar português, ele e o pai, Gabriel Kaxuyana Tiriyo, 36, saíram das terras indígenas onde vivem, no Pará, para buscar atendimento médico no Amapá, após o quadro da criança de agravar.
Mas após pedido de ajuda das autoridades do local por causa do risco de vida, ele foi trazido para o Espírito Santo, onde foi atendido e operado pela equipe do Hospital Infantil e Maternidade Alzir Bernardino Alves (Himaba), em Vila Velha.
O diretor-geral do Himaba, Claudio Amorim, revelou que a Secretaria de Saúde do Amapá fez o contato com o secretário da Saúde do Estado, Miguel Duarte, sobre a possibilidade de atendimento à criança no dia 10 deste mês.
“Era sábado de Carnaval, mas o secretário prontamente entrou em contato comigo e já conversei com a coordenadora da cardiologia pediátrica, Danielle Lopes Rocha. Ela, com os prontuários, avaliou e disse que era possível atendê-lo”.
Pai e filho chegaram no dia 12 deste mês ao hospital, que é referência na área. O cirurgião cardíaco Rafael Aon relatou que Garnison teve um quadro de insuficiência cardíaca causada por febre reumática.
“Ele teve uma infecção de garganta por um tipo específico de bactéria e, por ser suscetível à doença, o organismo dele criou anticorpos que combateram a doença e algumas estruturas do próprio organismo dele. No caso dele, atingiu a válvula mitral”.
O cirurgião revelou que a cirurgia da troca da válvula do coração aconteceu no dia 16 deste mês e durou mais de três horas. No dia seguinte, a melhora já podia ser observada. “Antes da cirurgia ele estava bem debilitado. Hoje, ele já se recupera muito bem”.
Gabriel disse estar feliz e aliviado ao ver o filho bem. Com ajuda de um tradutor, ele contou que o menino começou a passar mal desde setembro, mas o quadro foi se agravando.
Ele disse que estava levando o filho no posto de saúde que atende a aldeia, mas chegou a um ponto que os profissionais disseram que não tinham mais condições de tratá-lo, pois estava grave.
“Estou feliz em ver como ele está hoje e agradeço a todos do hospital pelo carinho com a gente. Foi difícil passar por tudo o que passamos, mas nunca desisti de apoiar e cuidar do meu filho”.
Garnison deve receber alta nesta semana. O retorno dele será providenciado pelo estado do Amapá, de onde veio o chamado.
Língua foi desafio e contou com a ajuda de tradutores
Mais de 10 dias depois da cirurgia que salvou a vida de Garnison Kaxuyana Tiriyo, de 7 anos, hoje ele dedica os dias ao seu novo passatempo preferido: colorir desenhos, com todo capricho e sem sair das linhas, com lápis de cor.
Segundo o pai, Gabriel Kaxuyana Tiriyo, os lápis têm encantado o menino, já que não tinha acesso na aldeia Missão Nova, na Terra Indígena Parque do Tumucumaque, no estado do Pará.
Pai e filho pertencem ao povo Tiriyo Kaxuyana, com uma língua que foi o primeiro desafio da equipe de profissionais do Hospital Infantil e Maternidade Alzir Bernardino Alves (Himaba).
A coordenadora de Humanização do hospital, Jaqueline Martins, contou que assim que pai e filho chegaram, em meio ao período de Carnaval, já enviou mensagem para grupos indígenas do Estado.
“Eles são povos muito unidos. Todos começaram a buscar alguém que ajudaria com a tradução. Não achamos ninguém no Estado, mas as mensagens circularam até chegar à coordenação nacional da Secretaria de Saúde Indígena, que nos ajudou”.
Segundo Jaqueline, foi possível também fazer contato com o cacique Juventino, da aldeia de Gabriel. “Isso nos ajudou a humanizar e respeitar a cultura deles. Precisávamos da autorização do pai para a cirurgia, mas Gabriel precisava entender o texto, todo o passo a passo do tratamento. Então, o cacique fez essa ponte e explicou tudo”, contou.
Hospital é referência cardiológica
Com uma média de 120 cirurgias cardíacas por ano em crianças e adolescentes, o Hospital Infantil e Maternidade Alzir Bernardino Alves (Himaba), em Vila Velha, hoje é referência na área.
O diretor-geral da unidade, Claudio Amorim, contou que o serviço da cardiologia pediátrica começou a ser implantado em 2010, quando o secretário de Estado da Saúde era Tadeu Marino.
“Desde então, viemos estruturando e ampliando o atendimento. Para se ter uma ideia, em 2011, fizemos oito cirurgias cardíacas. Em 2023, foram 178 cirurgias. Ao todo, já somam 1.659”.
Ele destacou que as crianças atendidas hoje pelo serviço são todas aquelas diagnosticadas através da atenção primária e secundária, e que precisam do atendimento.
“A equipe hoje é composta por diversos profissionais, sendo cerca de 30 médicos cardiologistas e cirurgiões. Atendemos a crianças de todos os municípios, inclusive de outros estados”.
Na equipe há mais de uma década, o cirurgião cardíaco Rafael Aon pontuou que as cirurgias mais realizadas pela equipe são aquelas ligadas a má-formações congênitas, quando a criança já nasce com algum problema de coração.
Em setembro do ano passado, Rafael Aon e outros membros da equipe de cardiologia do hospital apresentaram artigos científicos no 8º Congresso Mundial de Cardiologia e Cirurgia Cardíaca Pediátrica, em Washington, Estados Unidos.
Comentários