Plano de saúde popular com direito a consultas, mas sem internação
Governo quer criar regras para convênios apenas ambulatoriais, para atender ao público que não tem acesso a planos mais completos
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Uma boa notícia para quem deseja ter um plano de saúde, mas se esbarra nos valores de coberturas mais completas: a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) quer criar regras para venda de planos exclusivamente ambulatoriais, sem cobertura de internação de emergência por até 24 horas. Hoje, já existe no mercado convênio ambulatorial, mas com internação de emergência por até 24 horas.
Há expectativa de que essa nova modalidade de convênio médico, que dá direito apenas a consultas e exames, atenda ao público que, atualmente, está comprando os cartões de saúde, um serviço pré-pago para atendimentos médicos.
Em reunião do colegiado realizada na última sexta-feira (27), o presidente da ANS, Paulo Rebello, defendeu um debate sobre as regras de venda de planos exclusivamente ambulatoriais.
“Hoje em dia, sabemos que há cerca de 60 milhões de pessoas usando cartões de desconto, que são produtos baratos, sem qualquer tipo de regulação e fiscalização, mas que possibilitam a realização de consultas e exames. É a forma como essas pessoas encontraram de ter acesso aos serviços de saúde”, disse Rebello.
Para ele, a proposta de rever as regras dos planos exclusivamente ambulatoriais visa dar aos consumidores a possibilidade de ter planos com preços mais baixos, regras claras e coberturas garantidas, possibilitando o cuidado com a saúde e a realização de consultas e exames como forma de prevenir doenças ou identificá-las na fase inicial.
“Fico imaginando uma mãe com seu filho gripado, sem condição de ter qualquer atendimento, podendo ter o caso agravado e até vir a precisar de internação. Ter assistência logo que os sintomas aparecem pode fazer toda a diferença no resultado em saúde”, disse Rebello.
A criação do novo produto depende de análise interna da ANS e consultas públicas com a sociedade, operadoras, entre outros trâmites.
O presidente da Comissão da Saúde Pública e Suplementar da Ordem dos Advogados do Brasil, seccional capixaba (OAB-ES), Marcus Luiz Moreira Tourinho, cita que este modelo já é praticado em alguns mercados internacionais e tem sido visto como uma alternativa mais acessível para os consumidores que não podem arcar com os custos de planos mais completos.
“Os planos ambulatoriais podem, em teoria, ajudar a aliviar a pressão sobre o Sistema Nacional de Saúde (SNS), uma vez que oferecem uma via privada para consultas e exames, reduzindo os tempos de espera no sistema público”.
Na torcida
O pedreiro Luiz Felipe Gonçalves, 39 anos, não tem um plano de saúde atualmente porque não pode pagar. “Eles são muito caros e a gente procura mais barato e não consegue encontrar”.
Ele considera importante cuidar da saúde e aproveitaria a oportunidade de um plano mais acessível. “Hoje em dia está tudo difícil. Marcar consulta, fazer exame, um plano me ajudaria muito a me cuidar”.
"Um plano de saúde ajudaria"
Mãe de três filhos, a supervisora Miriam Reis, 36 anos, adoraria ter a opção de um plano de saúde que fosse mais acessível.
Ela conta que precisou recorrer ao serviço público de saúde quando seu filho de 14 anos teve uma crise de asma. “Cheguei às 11 horas e só saí às 3 horas”.
Miriam descreve sua rotina como “corrida”. “Um plano de saúde ajudaria muito a cuidar da minha família. Às vezes, a gente deixa de ir ao hospital por causa dessa demora”.
Qualidade
Anderson do Nascimento, 34 anos, é desenvolvedor de games e está sem plano de saúde desde que ficou desempregado. “Eu recentemente fui desligado de uma empresa e fiquei sem plano”.
Na sua opinião, é importante que o plano seja acessível, mas também que tenha qualidade.
“Eu gostaria desse plano mais barato, mas teria que ter qualidade e um bom atendimento”.
Passo importante
“A reformulação das regras para planos exclusivamente ambulatoriais é um passo importante para ampliar o acesso à saúde, especialmente para os milhões de brasileiros que recorrem a cartões de desconto, sem garantias de regulação. Mas é fundamental que o novo modelo preserve a qualidade do atendimento e a justa remuneração dos profissionais médicos, evitando a precarização.
A democratização do acesso à saúde deve ser feita de forma segura e sustentável, assegurando a integridade do sistema e garantindo que o atendimento médico continue sendo de excelência para toda a população.”
Entenda
Preços e reajustes de planos
A diretoria da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) aprovou, na sexta-feira (27), a realização de um projeto de reformulação da política de preços e reajustes dos planos de saúde privados. Os temas serão levados à audiência pública no dia 7.
Inicialmente, a diretoria de Normas e Habilitação de Produtos propôs levar para a sociedade o debate sobre o aprimoramento de regras relacionadas ao reajuste de planos coletivos; a mecanismos financeiros de regulação – como coparticipação e franquia; à venda de planos via internet e à revisão técnica de preços de planos individuais/familiares.
Planos ambulatoriais
A ANS fará também uma Tomada de Subsídios, com o objetivo de conseguir um número maior de contribuições para o tratamento dos temas.
Em seu voto, o diretor-presidente da ANS, Paulo Rebello, propôs a inclusão de mais um item nessa tomada de subsídios: o debate sobre as regras para venda de planos exclusivamente ambulatoriais.
Ele disse que há potencial para aumentar cerca de 100 milhões de usuários. A ideia é ter as duas opções de plano ambulatorial, com e sem atendimento de emergência.
Todos os pontos em discussão podem ser consultados no site www.gov.br/ans/pt-br/
Decisão do STJ
Há uma decisão do Superior Tribunal de Justiça determinando que a ANS regule os cartões de saúde, uma espécie de serviço pré-pago para atendimentos médicos simples e que pode ser emitido por diferentes tipos de empresas, não operadoras, o que dificulta um acompanhamento da ANS que é focado no mercado de planos de saúde.
Transparência
Para o presidente da Comissão da Saúde Pública e Suplementar da OAB-ES, Marcus Luiz Moreira Tourinho, a convocação da audiência pública destaca o caráter participativo e transparente, permitindo a sociedade civil, entidades reguladoras, consumidores e representantes do setor privado contribuírem para o debate.
O outro lado
A Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge) entende que a iniciativa do órgão regulador de estimular um debate técnico em busca de soluções estruturantes é positiva.
Segundo a Abramge, é fundamental destacar que essa é uma discussão técnica complexa, que requer aprofundamento e racionalidade entre os diversos agentes de saúde, incluindo a análise das melhores práticas internacionais.
“Nesse contexto, o papel regulatório da ANS é de extrema importância, especialmente considerando que atualmente cerca de 40 milhões de brasileiros pagam mensalidades para serviços não regulados, sem garantias e fiscalização, uma modalidade que opera à margem da regulação do setor”.
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