Vovôs que dançam para preservar história do ES
Grupos folclóricos de caxambu e jongo fundados há mais de 100 anos mantêm as tradições culturais de seus antepassados
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Vinte e dois grupos folclóricos fundados há mais de 100 anos preservam a memória de conquistas históricas no Espírito Santo. São os vovôs que dançam jongo e caxambu para manter o legado cultural dos seus antepassados.
Em Alegre, o Caxambu do Horizonte se consolidou como cultura popular graças ao trabalho de gerações construído para que a prática pudesse sobreviver.
Um dos integrantes do grupo, José Silva, conhecido como Daú, deu uma pista sobre a sobrevivência do caxambu em sua família.
“O caxambu é união, diversão, reunião de família. Sempre que a gente se reúne fazemos a roda. Se tem casamento, festa de aniversário, final de semana, tem caxambu”. União é a palavra que move a história do grupo de Caxambu do Horizonte.
Localizado no distrito de Celina, o grupo de tradição familiar é formado por aproximadamente 15 integrantes, todos eles de laço de parentesco. Ele tem na figura do mestre Antônio e de sua esposa, Enedina Soares da Silva, conhecida como Dona Fia, suas maiores representações.
Os tambores utilizados pelo grupo, de acordo com integrantes, também são peças centenárias. Deitados no centro da roda, os tambores, conhecidos como candongueiro e o chamador, são reverenciados como entidades ancestrais e instrumentos de ligação entre o presente o e passado através das memórias revividas.
A roda é composta de dançarinos que giram em volta dos tambores e repetem os pontos entoados pelo mestre e pelos jongueiros, que se apresentam de maneira intercalada.
O grupo se reúne na casa do mestre, em encontros familiares e em participações externas quando convidados.
Como marco principal, o grupo considera a data 13 de junho como o dia da grande roda, em que se comemora o aniversário do mestre e também a integração da família, que perpetua essa tradição e carrega consigo as memórias do Horizonte.
Já a banda de Jongo de São Benedito, de Alfredo Chaves, foi uma das vencedoras do Prêmio Mestre Armojo do Folclore Capixaba 2019. Formanda por mais de 15 integrantes, o grupo se apresenta em eventos culturais.
Mestre da banda, Manoel Alves, o Seu Tito, disse que o importante é manter viva a tradição. “É uma honra levarmos o legado de quem veio antes da gente”.
GRUPOS FOLCLÓRICOS DO ESPÍRITO SANTO
Jongo e caxambu
Alegre
- Caxambu do Horizonte.
Alfredo Chaves
- Banda de Jongo de São Benedito.
Anchieta
- Jongo de São Benedito Sol e Lua (Sede).
- Tambores de São Mateus (Comunidade de São Mateus).
Cachoeiro de Itapemirim
- Caxambu Alegria de Viver (Vargem Alegre)
- Caxambu da Velha Rita (Morro do Zumbi).
- Caxambu Santa Cruz (Monte Alegre).
Conceição da Barra
- Jongo de São Bartolomeu (Bairro Quilombo Novo).
- Jongo de Santa Ana (Bairro de Santana),
- Jongo de São Benedito e São Sebastião (Itaúnas)
- Jongo de São Benedito das Piabas (Comunidade de São Benedito das Barreiras).
- Jongo de Santa Bárbara (Comunidade Quilombola de Linharinho).
- Jongo de Cosme Damião (Comunidade Porto Grande).
- Jongo de N. Senhora da Aparecida (Córrego do Alexandre).
Itapemirim
- Jongo do Mestre Wilson Bento.
- Jerônimo Monteiro
- Caxambu Andorinhas.
Mimoso do Sul
- Caxambu da Associação Folclórica de Santo Antônio de Muqui.
Muqui
- Caxambu da Família Rosa.
Presidente Kennedy
- Jongo Mãe África Pátria Amada (Comunidade de Boa Esperança e Cacimbinha).
São Mateus
- Jongo de São Benedito.
- Jongo de Santo Antônio (Comunidade de São Cristóvão).
- Jongo de São Benedito de Campo Grande.
Fonte: Iphan.
Mestre é guardião do conhecimento
No jongo, uma das mais antigas tradições afro-brasileiras, o mestre ocupa um papel central e de extrema importância. Ele é considerado o guardião do conhecimento e da cultura transmitida oralmente, sendo responsável por conduzir o ritmo, os cânticos e a dança.
Mestre do Jongo de São Benedito Sol e Lua, de Anchieta, Hudson Antunes revelou que seu papel é uma espécie de ponte entre passado e futuro.
“O mestre atua como um elo entre o passado e o presente, sendo o principal responsável por ensinar as novas gerações, garantindo a continuidade dessa manifestação cultural. Além de comandar o ritmo e os tambores, também organiza a roda, garante o respeito aos rituais e lidera as preces, que muitas vezes são dirigidas a santos de devoção, como São Benedito”.
Hudson disse também que o mestre começa a roda com um “ponto”, versos improvisados ou tradicionais que carregam mensagens de resistência, fé e aspectos da vida cotidiana.
Especialista explica diferenças entre ritmos
O jongo e o caxambu são manifestações culturais afro-brasileiras profundamente enraizadas nas tradições dos descendentes de africanos escravizados, especialmente no Sudeste do Brasil.
Apesar de serem frequentemente tratados como sinônimos, especialistas garantem que existem algumas nuances que diferenciam esses dois termos, dependendo da região e do contexto em que são utilizados.
A pesquisadora e professora de História Joana da Penha faz parte da Banda de Jongo de São Benedito, de Alfredo Chaves, e explicou que o jongo é uma expressão cultural que envolve música, dança e canto, praticada principalmente em estados como Rio de Janeiro, São Paulo e Espírito Santo.
“No jongo, os participantes dançam em roda ao som de tambores, que incluem o caxambu (o tambor maior) e o candongueiro (tambor menor). Os pontos cantados são improvisados ou tradicionais, e os dançarinos se revezam no centro da roda em pares, em um jogo de movimentos que carrega um simbolismo ancestral”.
Já o caxambu, segundo ela, pode se referir tanto ao tambor grande utilizado nas rodas de jongo quanto à própria prática do jongo, dependendo da localidade.
“Em algumas regiões do Vale do Paraíba, por exemplo, o termo caxambu é usado para denominar a manifestação cultural como um todo, o que gera certa confusão com o jongo. Nesse contexto, caxambu e jongo são vistos como a mesma prática, com a variação de nomenclatura”.
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