“Adquiri várias sequelas pelo uso indiscriminado de remédios”, diz vendedora
Médicos afirmam que automedicação traz riscos à saúde
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Foram cinco anos tomando remédio atrás de remédio para ter alívio nas dores que sentia nas pernas e na lombar. Foi assim que a vendedora externa Sandra Miler, de 44 anos, adquiriu sequelas pelo uso indiscriminado de medicamentos.
“Eu sentia muita dor na lombar e nas pernas. Cheguei a fazer uma cirurgia de varizes achando que resolveria o problema. Eu tomava uma média de quatro tipos de analgésicos por dia e alguns anti-inflamatórios”, conta Sandra.
Ela relata que começou a se automedicar quando era atendente de telemarketing em uma distribuidora de medicamentos e passou a pesquisar sobre os remédios.
Sandra fez vários exames por causa das dores, como ressonância na coluna e ultrassom nos pés. Quando os remédios pararam de fazer efeito, Sandra buscou ajuda médica. “A dor se tornou generalizada por todo o corpo, me chamavam de Maria das Dores. Até entrei em depressão e já não tinha prazer de viver”.
O uso sem prescrição teve um custo para a saúde da vendedora, que também chegou a utilizar remédios para dormir com o intuito de não sentir dor.
“Adquiri várias sequelas pelo uso indiscriminado de medicamentos que me trouxe aumento de ansiedade, problemas gastrointestinais, além do diagnóstico tardio de fibromialgia, pelo fato de as medicações terem mascarado minha real condição de saúde”.
Atualmente, Sandra é acompanhada por um especialista. “Graças a Deus, eu me sinto bem melhor, não só pelo tratamento e a melhora física, mas também pelo fortalecimento mental que foi de suma importância para a minha mudança de comportamento e qualidade de vida”, afirma.
Mascarar
Além da dependência, usar medicamentos sem prescrição podem ainda mascarar, de fato, uma doença, segundo médicos.
“A automedicação acaba trazendo repercussões. A pessoa pode até ter um alívio da dor, mas ela não sabe nem a causa e nem a origem dessa dor”, destaca o anestesiologista e especialista em dor crônica André Felix.
“O grande problema é a automedicação. Na bula dos remédios, tem os feitos positivos, mas também há os efeitos negativos, e a pessoa pode vir a ter alguma doença”, alerta o médico.
Excesso compromete memória
Entre os diversos problemas que o consumo em excesso de remédios pode causar, médicos também chamam a atenção para comprometimentos de rins e memória.
“Os riscos são inerentes ao tipo de remédio, dose e tempo de uso. Há o perigo de comprometimento hepático, renal, assim como comprometimento da memória e da consciência, com alterações comportamentais. Além disso, o uso indiscriminado de remédios para dor e para a insônia pode piorar a dor e a insônia”, destaca a psiquiatra e presidente da Associação Psiquiátrica do Espírito Santo, Lícia Colodete.
O anestesiologista e especialista em dor crônica André Felix ressalta ainda que, além de problemas renais, os anti-inflamatórios, por exemplo, podem causar comprometimentos no intestino e coração.
No caso das medicações para dormir, a presidente da Associação Brasileira de Medicina do Sono do Estado, a pneumologista Jessica Polese, explica que os benzodiazepínicos podem causar depressão respiratória. Por isso, só devem ser usados com indicação e acompanhamento médico.
“Isso pode ocorrer, principalmente, em pacientes com problema respiratório. Alguns desses remédios podem provocar arritmia e matar, mas isso é raro. As drogas Z, como zolpidem, já têm um perfil de tolerância bem amplo”.
Perigos da automedicação
Efeitos adversos e doenças
De acordo com o neurologista e especialista em dor crônica Ramon D'Ângelo Dias, toda medicação pode determinar efeitos adversos. Por exemplo, anti-inflamatórios podem causar sangramentos do trato gastrointestinal ou piora da função renal. Opioides podem determinar sonolência, confusão mental ou até mesmo depressão respiratória e morte.
Por mais “simples” que uma medicação possa parecer, ela pode sim levar a um transtorno de utilização de substâncias.
O uso de remédios em excesso e sem prescrição mascara uma doença mais grave.
Os remédios podem ainda determinar cronificação e agravamento das dores, segundo o médico Ramon D'Ângelo.
Sinais de dependência
O psiquiatra Caio Gibaile elenca alguns sinais de dependência em medicamentos, como:
O uso em quantidades maiores do que o ideal;
Tentativas frustradas de cessar ou controlar o uso;
Investimento de muito tempo não só no uso, mas também nas formas de conseguir o medicamento (por exemplo: uma pessoa que agenda e vai a várias consultas com médicos diferentes para tentar obter múltiplas receitas).
A pessoa pode, inclusive, deixar de cumprir obrigações e de frequentar atividades sociais para poder ficar isolada usando o medicamento.
Fontes: Ramon D'Ângelo Dias, neurologista e Caio Gibaile, psiquiatra.
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