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Colunista

Leitores do Jornal A Tribuna

Entre bolhas e desamparos, a desumanidade como sina

Confira a coluna de domingo (06)

José Antonio Martinuzzo | 07/04/2025, 12:12 h | Atualizado em 07/04/2025, 12:12

Imagem ilustrativa da imagem Entre bolhas e desamparos, a desumanidade como sina
José Antonio Martinuzzo é pós-doutor em Psicanálise (UERJ), doutor em Comunicação (UFF) e professor titular da Ufes |  Foto: Acervo pessoal

Era uma vez, um tempo em que a exclusão digital se fazia questão crucial. Isso lá no longínquo fim do século XX. Duas décadas e meia depois, num planeta de 8 bilhões de habitantes, no qual cerca de 70% da população acessa internet e tem celular, o problema não é mais o que ocorre fora do “continente de bytes”, mas, sim, o que se vive dentro dos territórios das redes – e que vem afetando drasticamente a realidade como um todo.

A série “Adolescência”, sucesso da Netflix, pode ser percebida sob vários pontos de vista, mas não dá para fugir da percepção de que o atual modo de existir, bidimensional (presencial-digital), está sendo convulsionado pelas ocorrências registradas nos ciberterritórios, já “habitados” por mais de 5 bilhões de perfis.

A ficção – que poderia perfeitamente não ser – gira em torno da prisão de um garoto de 13 anos, acusado de ter matado a facadas uma colega de escola, em meio a uma trama de bullying registrado tanto nos corredores do colégio quanto nos feeds das redes – este, sim, o grande espaço de visibilidade dos nativos digitais, aqueles que já vieram à luz sem a possibilidade de pensar a vida apenas no plano analógico, ou seja, da materialidade.

O que se testemunha em quatro episódios é uma tragédia de alucinados. Sujeitos perdidos entre bolhas de conexões indecifráveis a quem está de fora. Aturdidos, diante de abismos linguageiros e afetivos. Insulados em seus medos e desamparos, apesar de hiperconectados. Indivíduos desalmados pela experiência informacional da aparência, capturados nas redes monetizadas, reduzidos ao ver e ao dar-se a ver das multitelas.

Jamie esfaqueia o corpo e vai dormir – sobre o quê dirá repetida vezes: “Não fiz nada”. Já preso, se intriga com a observação da psicóloga de que a assassinada nunca mais postará nas redes: “Está morta!”. A dissociação entre corpo vivente e perfil informacional é tão espantosa quanto inverossímil para aqueles que ainda também vivem com os pés no chão.

Tecnologias não são autônomas. Usos configuram seus status entre nós. Desafortunadamente, as “doces técnicas digitais”, como as chamava Milton Santos, por causa da sua inigualável capacidade de se adaptar às necessidades humanas, estão se tornando um empecilho à civilização humanística.

Mesmo diante de técnicas potencialmente deificadoras, é preciso lembrar o “quão frágeis nós somos”, como diz a canção que guia os olhos num aterrador sobrevoo à “normalidade” de uma era em que matar corpos de carne e osso parece perder relevância diante das demandas do existir digital.

Que sombrio destino nos espera, quando os sujeitos que estamos formando alienam-se de sua própria condição de habitar um corpo. Que ruinosa fatalidade nos aguarda, quando, numa realidade de hipercomunicação, estamos desaprendendo a dialogar, falar uma mesma língua dentro da uma mesma casa, uma mesma escola. Que desgraçada sina estamos construindo, quando, num tempo mediado por imagens, não conseguimos sequer enxergar o próximo como um semelhante.

Era uma vez?

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