Justiça do ES recebe 167 ações todo dia por abuso ao consumidor
No Espírito Santo, 45.718 ações foram abertas de janeiro a setembro, sobretudo por problemas bancários, cobranças indevidas e falhas em serviços.
No Espírito Santo, a cada 24 horas, 167 consumidores recorrem à Justiça para combater abusos e práticas ilegais que afetam seus direitos.
De acordo com dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), de janeiro até o dia 30 de setembro deste ano, o número total de queixas no Estado chegou a 45.718.
Entre as principais reclamações, estão problemas bancários, práticas abusivas, cobranças indevidas em cartão de crédito, overbooking (excesso de reservas), cancelamento e atraso de voo, inclusão indevida em cadastro de inadimplentes, telefonia, extravio de bagagem, serviços hospitalares, financiamento de produtos e vendas casadas.
Nesse contexto, todos os consumidores solicitam indenização por dano moral, enquanto 26.415 também pleiteiam compensação por dano material. O valor das indenizações varia conforme a complexidade de cada caso, mas a advogada especialista em Direito do Consumidor, Denize Izaita, conta que, nos casos em que atuou, os valores chegaram a cerca de R$ 10 mil.
Para Camila Rodrigues, advogada especialista em Direito do Consumidor, a judicialização decorre principalmente da ineficácia dos canais administrativos de solução de conflitos.
“Os consumidores recorrem ao Judiciário quando não obtêm respostas adequadas nos SACs (serviços de atendimento ao cliente) e ouvidorias, enfrentam práticas abusivas reiteradas, como cobranças indevidas e propaganda enganosa, e muitas vezes desconhecem alternativas como Procon e consumidor.gov.br (site)”.
Ela ressalta que o Código de Defesa do Consumidor assegura direitos básicos. “No entanto, sua efetivação ainda depende excessivamente da via judicial, o que sinaliza deficiências na autorregulação do mercado”.
Queixas também chegam ao Procon. Neste ano, até a última terça-feira, foram 37.446. As principais demandas envolvem negociação de dívidas, cobrança indevida, crédito consignado, produto ou serviço com vício de qualidade, alteração unilateral, taxas de juros e descumprimento de contrato.
Segundo a diretora-geral do Procon-ES Letícia Coelho Nogueira, é fundamental que os consumidores estejam atentos em todas as suas relações de consumo, verificando contratos antes de assiná-los, movimentações em sua conta bancária, observando a clareza das informações prestadas e denunciando práticas abusivas.
“Nosso trabalho é estar ao lado da população, orientando e assegurando que seus direitos sejam respeitados”, ressaltou a diretora.
“Consumidor não deve se calar”
Quem levou um susto ao descobrir que seu nome havia sido negativado indevidamente foi a servidora pública Angélica de Oliveira, de 48 anos. A surpresa veio quando ela tentou fazer um empréstimo e soube que seus dados estavam sendo usados de forma fraudulenta.
Seu nome foi associado ao financiamento de um carro e a compras feitas em uma loja de departamentos em Vitória, mas com transações realizadas em São Paulo e no Rio Grande do Sul.
Revoltada com a situação, Angélica decidiu recorrer à Justiça e aguarda o desfecho. “O consumidor jamais deve se calar”.
Tire as dúvidas
Fui lesado, o que fazer? Ir ao Procon basta?
O Procon é um órgão administrativo, que busca a solução de conflitos de forma extrajudicial. Muitas das queixas encaminhadas pelos consumidores são resolvidas no ato do atendimento.
Quando o fornecedor não resolve imediatamente, pode-se formalizar a reclamação, que é um processo administrativo. Nesse caso, a empresa é notificada, podendo ser designada uma audiência que contará com a presença das partes envolvidas, na oportunidade em que o órgão intermediará a composição do conflito.
Como a ação dos órgãos de defesa do consumidor é independente, se o consumidor registrar sua reclamação junto ao Procon e também no poder judiciário, isso não implicará o encerramento automático de nenhuma das demandas, cabendo a adoção das providências cabíveis no âmbito da competência de cada órgão.
Como registrar reclamações?
Isso pode ser feito pessoalmente na sede do Procon-ES, na Avenida Jerônimo Monteiro, 935, no centro, em Vitória, de segunda-feira a sexta-feira, mediante agendamento pelo site www.agenda.es.gov.br.
O consumidor também pode registrar reclamações, sem sair de casa, pelo Atendimento Eletrônico, disponível no site www.procon.es.gov.br.
Denúncias e dúvidas podem ser formalizadas pelo WhatsApp (27) 3134-8499.
Para pleitear indenização, é preciso entrar na Justiça. Como? Tem de ter advogado?
Sim. O consumidor lesado, deve entrar na Justiça. Para isso, pode procurar um advogado ou ingressar de forma autônoma, exercendo o chamado jus postulandi, que nada mais é do que o direito de pedir em juízo, desde de que o valor do seu pedido não ultrapasse 20 salários mínimos e o ajuizamento da ação seja nos Juizados Especiais Cíveis.
Se a ação for protocolada na Justiça Comum, por exemplo quando há necessidade de produção de prova pericial ou o valor da causa for superior a 40 salários mínimos, será necessário ter um advogado.
E se não tenho advogado, qual o caminho?
Nesse caso o consumidor poderá ingressar sozinho na Justiça, estando limitado aos Juizados Especiais Cíveis e com o valor da causa de até 20 salários mínimos ou procurar a Defensoria Pública ou os núcleos de atendimento jurídicos das Faculdades de Direito.
Especialistas falam sobre alto número de processos
O volume expressivo de demandas consumeristas tem impactado o Judiciário, e o assunto divide opiniões. Segundo alguns juristas, isso não deve ser encarado como excesso de ações. Já outros veem abuso por parte de alguns consumidores aventureiros.
Para Camila Rodrigues, advogada especialista em Direito do Consumidor, as ações representam “o exercício legítimo do direito constitucional de acesso à Justiça”.
Para ela, a alta demanda é um reflexo da conscientização dos consumidores sobre seus direitos e da busca por reparação diante dos abusos sofridos.
Já Wanderson Gonçaves Mariano, advogado consumerista, avalia que muita gente ingressa com ação sem o menor cabimento ou prova, muitas vezes amparada pelo benefício da gratuidade de justiça e com a certeza de que se perder não terá consequência. “Isso abarrota o Judiciário, alonga a fila de audiências, faz com que os despachos e sentenças demorem a sair”.
No seu entendimento, deveria haver um “filtro” na hora da propositura da ação, principalmente as propostas diretamente pela parte, sem a presença do advogado.
“Vemos muitas ações protocoladas com vícios insanáveis que sequer deveriam ser admitidas. Entendo também que o Juízo deveria, ao analisar a petição inicial exercer outro rigoroso filtro, verificando se a ação preenche os requisitos legais”, finalizou Wanderson Mariano.
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