Enem dos Concursos: briga no CNU pode causar “apagão de servidores”
Justiça determinou a anulação de candidatos que não marcaram o cartão de prova. Caso pode virar batalha e travar o serviço público
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A briga judicial envolvendo o Concurso Nacional Unificado (CNU) pode prejudicar o funcionamento do serviço público federal, segundo especialistas.
O CNU é considerado vital para renovar o quadro de funcionários nos órgãos públicos, e um eventual atraso na nomeação de aprovados pode afetar vários órgãos, criando filas, sobrecarga de trabalho e até “apagões” em algumas funções.
Recentemente, a Justiça Federal de Tocantins emitiu liminar anulando a eliminação de candidatos que não preencheram da forma adequada o cartão de resposta da prova. Especialistas em Direito Constitucional e Administrativo já preveem que a situação se arraste no Judiciário e possa parar no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
“Há o risco de que, da mesma forma que a Justiça Federal de Tocantins se manifestou, cada juiz federal pelo País também ser chamado a se manifestar, o que resultaria em 'chuva' de liminares. Por isso, tendo a acreditar que a questão acabe no STJ”, explicou o advogado Edward Barbosa Felix.
Para o advogado Eduardo Sarlo, qualquer paralisação ou atraso no CNU pode significar a manutenção de lacunas de pessoal em setores que já enfrentam insuficiência de Recursos Humanos, o que pode resultar em paralisações.
“De modo que, serviços diretamente ligados à Saúde, Educação, Segurança Pública e Administração podem ser comprometidos, agravando problemas como filas, atrasos e sobrecarga de trabalho em setores essenciais.”
Já o advogado Leonardo Ribeiro considera que a Advocacia-Geral da União (AGU) tem argumentos tanto para acatar a liminar da Justiça Federal, quanto para recorrer.
Para ele, por um lado, a AGU pode argumentar que a suspensão ou modificação do AGU compromete o princípio da continuidade do serviço público, além de o risco de se abrir um precedente para que outros órgãos ou decisões judiciais questionem a autonomia administrativa do governo federal, enfraquecendo a centralização das nomeações.
Por outro lado, Sarlo avalia que acatar a decisão e reformular/adaptar o edital pra cumprir a decisão judicial, poderia acelerar a realização do concurso. “É possível que recorrer ao STJ somente seria adequado caso a decisão de Tocantins comprometa o modelo nacional do concurso, ou crie dificuldades que possam impactar futuros processos seletivos.”
Governo não confirma reintegração dos eliminados
O governo federal não confirmou, até o momento, a reintegração dos eliminados do concurso, cujo resultado final está previsto para ser publicado nesta quinta-feira. Ontem, o resultado da revisão dos títulos foi publicado, no site https://cpnu.cesgranrio.org.br/login
O Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos (MGI), responsável pela realização do concurso, disse que foi notificado sobre a decisão judicial, mas ainda não tomou decisão sobre uma eventual reintegração.
O tema da reintegração dos eliminados divide advogados. Flávio Fabiano diz que a lei que rege os concursos é o seu referente edital. “Todas as instruções estão lá. A Justiça não pode alterar as regras, uma medida dessas é até abusiva.”
Já o advogado Igor Oliva de Souza argumenta que a decisão da Justiça Federal foi um passo importante para “garantir justiça a todos que foram prejudicados pela má instrução dos fiscais de sala e pela redação confusa do manual de prova”.
Entenda
Determinação
A Justiça Federal do Tocantins determinou que o governo federal cancele as eliminações dos candidatos do CNU, o “Enem dos Concursos”, que não preencheram todo o campo de identificação do cartão de respostas da prova.
Conforme a decisão, os responsáveis pela prova devem republicar o resultado incluindo o nome desses participantes em até 10 dias. Na época, a Advocacia-Geral da União (AGU) havia dito que iria recorrer.
A decisão atende a pedido do Ministério Público Federal, que questionou a validade das eliminações. Segundo o órgão, os fiscais orientaram os candidatos a transcrever só a frase da capa do caderno de questões, sem alertar sobre a necessidade de marcar o tipo de gabarito.
Não há, porém, determinação prevista no edital que obrigue os fiscais a fazer esse tipo de alerta, sendo o edital considerado a “lei” do concurso e deve ser seguido integralmente.
Na decisão, o juiz Adelmar Aires Pimenta da Silva alegou que as instruções da prova estabelecem “com clareza” que só os candidatos que não preenchessem nenhum dos dois campos, tanto o número do gabarito e a frase da capa, seriam eliminados.
O resultado final do CNU está previsto para ser publicado amanhã. O governo, porém, não informou se reintegrará ou não os eliminados.
Impacto no serviço público
Para especialistas consultados pela reportagem, o atraso na resolução desse imbróglio pode prejudicar a qualidade do serviço público, especialmente se a discussão se arrastar no STJ sem decisão provisória que mantenha a atividade do CNU.
Para o advogado Eduardo Sarlo, a decisão sobre recorrer ou não à Justiça Federal de Tocantins deve ser “estrategicamente avaliada, considerando os impactos jurídicos, administrativos e políticos da situação”.
Já o advogado Leonardo Ribeiro lista possíveis argumentos para a AGU acatar a decisão: Evitar judicialização prolongada: “Se recorrer prolongar o impasse e agravar os prejuízos ao serviço público, acatar a decisão pode ser mais pragmático.”
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