Pai que abandonou filha é condenado a pagar R$ 150 mil de indenização
Segundo o processo, a filha foi criada pela mãe e pelos avós maternos. Após a morte deles, ela tentou contato com o pai e foi bloqueada
Um homem foi condenado a pagar R$ 150 mil de indenização à filha por danos morais causados por abandono afetivo. Ele não tinha relação com a criança desde o nascimento.
Segundo o processo, durante a infância, a filha foi criada pela mãe, que morreu quando ela tinha apenas 5 anos. Com a morte da mãe, a menina passou a ser criada pelos avós maternos.
Após a morte dos avós, ela tentou contato com o pai, pelas redes sociais, mas foi bloqueada pelo genitor.
Advogado do caso, Charles Christian Alves Bicca contou ao Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) que a “jovem descobriu que uma irmã recebia tratamento totalmente distinto, com acesso a patrimônio bilionário, viagens internacionais e luxo, enquanto ela vivia em situação de pobreza”.
A sentença que fixou a indenização por abandono afetivo foi dada em segunda instância, pelo Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO).
A advogada e presidente do IBDFAM no Espírito Santo, Ana Paula Morbeck, explicou que o abandono afetivo refere-se à omissão dos deveres de cuidado, criação, educação, companhia e afeto por parte dos pais em relação aos filhos, independentemente de haver ou não abandono material.
“Não se trata de uma simples ausência de carinho, mas, sim, de uma falha grave no cumprimento dos deveres parentais que resulta em prejuízos psicológicos e emocionais significativos para o filho. É preciso entender que ao abandonar um filho o pai descumpre o dever de cuidar”.
O advogado e professor universitário Alexandre Dalla Bernardina destaca que ainda são muito comuns os casos de abandono afetivo de crianças, sobretudo por pais.
“Ao contrário do que muitos imaginam, o pai não tem apenas a obrigação de pagar a pensão alimentícia. Ainda que a criança more e fique sob a guarda exclusiva da mãe, o pai tem o dever de cuidar, conviver, orientar e prestar suporte emocional aos filhos. A paternidade não se esgota no pagamento da pensão”.
Alexandre destaca que o fato do pai pagar pensão alimentícia não afasta o seu dever de cuidar e prestar assistência afetiva aos filhos. Assim, mesmo que o pai pague pensão regularmente durante anos, poderá ser condenado ao pagamento de indenização por danos morais se não prestar assistência afetiva ao filho.

Alerta para riscos de transtornos mentais
Sentimento de desvalorização, abandono e até mesmo o risco de para desenvolvimento de transtornos mentais são alguns dos problemas que crianças que sofrem abandono afetivo dos pais podem apresentar, segundo especialistas.
“O abandono afetivo costuma deixar marcas profundas no desenvolvimento emocional, como baixa autoestima e insegurança emocional”, aponta a psicóloga Marília Zanette.
O psicólogo Rhamon Carvalho destaca ainda que, além de necessidades físicas, crianças também possuem necessidades emocionais fundamentais, como a de vínculo, segurança e acolhimento.
“Quando o abandono afetivo ocorre, a criança pode desenvolver a crença de que não é digna de amor ou que existe algo de errado com ela. Esses significados se transformam em modelos internos de funcionamento, moldando a forma como ela percebe a si mesma e aos outros”.
“Quando a criança cresce sentindo-se amada, valorizada e segura, constrói um senso positivo de si mesma e dos outros. Por outro lado, o abandono afetivo favorece o desenvolvimento de crenças centrais ligadas ao desamor, desvalor e desamparo”, frisa Rhamon.
Indenização depende da gravidade
Abandono afetivo
É a omissão dos pais ou responsáveis no dever de garantir o sustento e também o cuidado emocional e a convivência familiar. A Constituição estabelece que é obrigação da família proteger seus filhos de negligência, discriminação e violência.
Caso no Espírito Santo
Em 2022, a Justiça do Espírito Santo condenou – por meio da Ação Civil Pública movida pelo Ministério Público do Estado (MPES) – um casal adotivo a indenizar em R$ 50 mil uma criança de apenas 9 anos por abandono afetivo. Ela foi adotada com 1 ano de idade e abandonada aos 9 anos.
Casos no Brasil
Em 2012, um pai foi condenado a pagar indenização de R$ 200 mil para a filha pelos danos morais causados por abandono afetivo.
A decisão foi determinada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). O processo foi originado nos anos 2000 em Sorocaba, São Paulo. Na época da decisão, a filha já era adulta, casada e tinha filhos.
Agora, uma nova decisão, proferida pelo STJ, confirmou a condenação de um homem a pagar R$ 150 mil de indenização à filha por danos morais causados por abandono afetivo.
A decisão destacou que a ausência intencional do pai durante toda a infância e juventude da filha, associada ao descumprimento de suas obrigações legais e materiais, configurou dano moral.
Indenização
O dano não depende de traumas visíveis ou prejuízos materiais, segundo explicam os especialistas. Ele está na ausência do pai.
O valor da indenização é arbitrado conforme a gravidade do abandono, a duração do afastamento, as repercussões para a vítima e a capacidade econômica das partes, evitando enriquecimento sem causa e buscando desestimular condutas semelhantes.
Fontes: IBDFAM, MPES, Senado e especialistas consultados.
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