Giambattista Biasizzo: “Vim para a América no porão de navio”
Giambattista Biasizzo saiu da Itália aos 4 anos de idade com sua família em uma viagem longa, desafiadora e cheia de dramas
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“Milhões de italianos nascidos no período entre-guerras tiveram a vida profundamente marcada por todo o contexto social e político daquela época. Não foi diferente para a minha família. Aos 4 anos de idade, deixei a Itália e vim para a América nos porões de um navio.
Foi uma viagem longa, desafiante e cheia de dramas. Deixar a própria nação e reconstruir a vida em outro continente requer muita fé, coragem e esperança. Minha família se estabeleceu, inicialmente, em Junín, no interior da Argentina. Lá, nos adaptamos e construímos a vida.
Cheguei a cursar a universidade e a ter filhos em nosso país vizinho. Em 1975, deixei a Argentina por conta de uma crise econômica e vim para São Paulo e, depois, para Belo Horizonte.
Conheci Vitória e outras cidades do Espírito Santo enquanto vivia em Minas Gerais e não tive dúvidas: há cerca de 11 anos, me mudei para a capital capixaba para ter qualidade de vida na minha aposentadoria.
Oportunidades
Todo o sofrimento dos italianos que deixaram a pátria-mãe, expulsos pela miséria e por tantas outras dificuldades no fim do século 19 e durante os anos de guerra, no século 20, valeu a pena.
No Brasil e em outros países da América, esses italianos encontraram as oportunidades para realizar os sonhos de gerações de antepassados. Aqui, eles puderam comprar um ‘pedaço de terra’. É verdade que, quando chegaram, as condições eram péssimas, mas, na Itália, eles eram camponeses que trabalhavam para os proprietários de terra. Lá na Europa eles construíam a vida de outras pessoas.
No dia 11 de novembro, quando comemora-se o Dia de São Martinho, esses camponeses italianos tinham de renovar o contrato de trabalho e de ceder às condições impostas pelos patrões. Senão, deviam ir embora. Imagine para uma família com cinco ou seis filhos. Era um verdadeiro drama.
Já no Brasil, trabalhou-se muito para conquistar as terras, mas, no fim, havia a tranquilidade de que 11 de novembro seria um dia como qualquer outro. É um resgate da dignidade humana. A esperança por tempos melhores trouxe os italianos para a América e construiu um legado para os milhões de descendentes que aqui vivem.
Espírito Santo
Quando morei em Belo Horizonte, passei a conhecer o Espírito Santo. Escolhi me aposentar aqui, especificamente em Vitória, porque é o lugar que me oferece a combinação de fatores que eu buscava.
Assim como Santa Catarina, o mar e a montanha estão lado a lado e os descendentes de europeus conservam as tradições e cultuam a memória dos antepassados, por exemplo. A diferença é que, no Espírito Santo, temos um clima mais quente, o que eu prefiro.
Eu tenho filhos que moram em Buenos Aires, em São Paulo, em Belo Horizonte e na Alemanha. Quando me ligam e perguntam como estou, costumo brincar que estou em um dilema: ‘em qual praia irei hoje de manhã para aproveitar o sol e as belezas naturais?’. É o estilo de vida que eu buscava para a minha aposentadoria.
A influência italiana no Espírito Santo é sentida por comunidades de descendentes por todo o território capixaba. A memória dos imigrantes faz parte da história desse povo. No dia da comemoração dos 150 anos da imigração, por exemplo, pudemos sentir o entusiasmo, a alegria e a emoção desses descendentes.
Eu brinco que, naquele dia, Vitória esteve a um milímetro de uma enchente, porque havia inúmeras pessoas chorando. Foi tocante ver tantos ítalo-capixabas relembrando a história dos avós, dos bisavós e dos trisavós com o que imaginamos que tenha sido a Expedição Tabacchi.
Comunità
Hoje, após 11 anos vivendo no Espírito Santo, me sinto totalmente integrado à sociedade capixaba e contribuo para o fortalecimento do elo entre os ítalo-capixabas e a cultura italiana com o trabalho como um dos diretores da Associação Federativa Comunità Italiana do Espírito Santo.
Na Comunità, unimos pessoas que sequer sabiam que tinham conexões. Muitas vezes, por exemplo, uma família de Nova Venécia e outra de Aracruz têm o mesmo sobrenome por conta de antepassados que, de alguma forma, se separaram por acaso da vida.
Todas essas pessoas são, de alguma forma, italianos por sentimento, por pertencimento, pela simpatia e pelo reconhecimento da dupla cidadania mas, aqui, construíram a vida.
Desde criança, sou acostumado a ser um italiano fora da Itália. Para mim, morar no Brasil, na Argentina ou em Portugal, por exemplo, não me tornará menos italiano. Eu irei falar a língua local, consumir a culinária e me envolver culturalmente com o país. Não faço o fato de ser italiano um motivo de fanatismo. Honro minhas raízes e, onde estiver, valorizo a cultura e a história das pessoas.
- Depoimento concedido ao repórter Jonathas Gomes
História
Giambattista Biasizzo, de 80 anos, é um italiano que vive no Espírito Santo há cerca de 11 anos. Formado em Engenharia pela Universidad Nacional de Buenos Aires, o aposentado viveu na Argentina dos 4 aos 46 anos.
Quando se mudou para o Brasil, em 1975, em busca de melhores condições socioeconômicas para a família, o engenheiro viveu em São Paulo e, depois, em Belo Horizonte.
Hoje, Giambattista Biasizzo vive em Vitória, cidade que escolheu quando se aposentou, há cerca de 11 anos. Envolvido na comunidade ítalo-capixaba, ele se tornou um dos diretores da Associação Federativa Comunità Italiana do Espírito Santo.
A Comunità fortalece o vínculo entre os descendentes de italianos no Estado e a cultura italiana. Com isso, cria-se um ponto de partida para potencializar o intercâmbio entre o Espírito Santo e a Itália.
Fonte: Giambattista Biasizzo.
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