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Brasil

Moradores de Maceió protestam: 'Estamos sem dormir para prestar socorro"

Risco iminente de uma mina colapsar tem deixado a população apreensiva


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Diante do risco iminente de uma mina da cidade colapsar, moradores de Maceió protestaram nesta sexta-feira (1º) com queima de entulhos e pneus e bloqueio de vias. Desde quarta (29), dezenas de pessoas estão deixando as suas casas, enquanto outras pedem para ser incluídas no mapa de risco.

Um dos atos ocorreu no bairro dos Flexais. Os manifestantes reclamam de não terem sido contemplados no plano de realocação e temem ficar ainda mais isolados já que houve evacuação nas proximidades. Eles também pedem indenização à Braskem, empresa responsável pela mina de sal-gema.

Imagem ilustrativa da imagem Moradores de Maceió protestam: 'Estamos sem dormir para prestar socorro"
As comunidades dos Flexais, onde vivem cerca de 3 mil pessoas, estão ilhadas socialmente |  Foto: Cibele Tenório / Agência Brasil

Um segundo protesto aconteceu no bairro do Bom Parto, que teve mais residências adicionadas ao mapa de risco atualizado pela prefeitura na quinta (30) para incluir as novas residências.

Segundo Jackson Douglas Ferreira de Souza, 42, membro do MUVB (Movimento Unificado contra a Braskem), são 812 residências nos Flexais, com 3.500 pessoas, conforme pesquisa feita pelos moradores há um ano e meio.

O pedreiro Fabiano dos Santos Oliveira, um dos moradores dos Flexais, cobra a inclusão do local na área de risco.

"A nossa reivindicação da gente é a opressão que a gente vem sofrendo aqui nos Flexais, nessas áreas que a Defesa Civil alega que não estão condenadas. Nós temos vários estudos que comprovam isso. Nossas residências estão cheias de fissuras, rachaduras, sentindo esses tremores e abalos."

O morador relata a agonia das famílias com a situação. "A gente já não aguenta mais. Depois desse caos, desse alarde, a gente não tem mais sossego nem paz. Não conseguimos dormir. Todo dia tem uma nota com o horário que a mina vai romper e ficamos aqui na ansiedade, e isso não acontece. Dia após dia desse jeito. As pessoas estão adoecendo, em pânico, sem ter o que fazer."

Os moradores afirmam, ainda, que o comércio local deixou de funcionar. Também não há escolas, e somente uma igreja continua a receber fiéis.

Na quinta, a reportagem presenciou um cenário de abandono. Praças vazias, com pouco movimento de carros. As casas se deteriorando. Em algumas, o pedido de realocação já pichado nos muros ou o aviso de que ainda havia famílias ali.

"Tenho que trabalhar. Dependo da minha renda, dos meus comércios, de tudo o que eu fazia antes. Hoje só tenho dinheiro para pagar as minhas contas", disse Valdemir Alves dos Santos, autônomo.

O porteiro Ronaldo Vicente Ferreira, 50, afirmou que todos estão em estado de alerta desde o anúncio do risco de colapso da mina.

"Estamos sem dormir para prestar socorro a um e a outro. Tem que tirar as pessoas para um lugar em que se sintam confortáveis, porque temos crianças, idosos e animais."

Moradores da comunidade do Flexal fizeram um protesto e bloquearam a passagem de veículos, trens e VLTs, nesta sexta-feira (1º), no bairro Bebedouro, em Maceió; ggrupo exige a realocação para um local seguro, além de uma indenização por parte da Braskem - Fabiano dos Santos Oliveira

Questionada, a Defesa Civil e Braskem não informou o motivo de a região dos Flexais não ter sido incluída na área de risco.

Em 2022, a Braskem firmou um acordo com a Prefeitura de Maceió, Ministérios Públicos estadual e federal, além da Defensoria Pública da União, para oferecer uma indenização de R$ 25 mil por família dos Flexais por conta dos danos materiais e morais decorridos do isolamento, além de obras para revitalizar a região.

Em nota, a empresa afirma que o programa de apoio financeiro "integra o Projeto de Integração Urbana dos Flexais, junto com outras 23 ações estabelecidas em razão dos impactos decorrentes da situação de ilhamento socioeconômico constatada por estudos técnicos da Defesa Civil Municipal".

O apoio financeiro foi colocado à disposição da população dos Flexais, de forma opcional, como uma alternativa a demandas judiciais, segundo o comunicado.

"O pagamento é feito às famílias que moram na região, que possuem comércio ou empresa e também para proprietários de imóveis desocupados nos Flexais".

O valor da indenização, ainda segundo a nota, foi estabelecido após discussões com as autoridades signatárias do Acordo dos Flexais e abrange uma parcela única no valor de R$ 25 mil reais, que pode ser acrescida de uma parcela de R$ 5.000 por atividade econômica, além da possibilidade de apuração de lucros cessantes para comércios formais.

O programa prevê um total de 1.776 propostas financeiras e registra a adesão de 99,8% dos moradores da área. Até o momento, 1.724 propostas foram apresentadas, das quais, 1.672 pagas.

ENTENDA O CASO

Na quarta-feira, a Defesa Civil de Maceió alertou que uma mina da Braskem está em risco iminente de colapso. A população que mora próximo à área atingida foi orientada a deixar o local e procurar abrigo, e a prefeitura decretou estado de emergência por 180 dias.

A situação tem ligação com o afundamento do solo que atinge cinco bairros da capital de Alagoas. O problema começou em março de 2018 e até hoje não foi solucionado. O Serviço Geológico do Brasil, órgão do governo federal, concluiu que as atividades de mineração da empresa em uma área de falha geológica causaram o problema.

Desde então, mais de 60 mil famílias dos bairros Pinheiro, Mutange, Bebedouro, Bom Parto e Farol foram realocadas para outros pontos da cidade.

Segundo autoridades, uma cratera do tamanho do estádio do Maracanã pode ser aberta no Mutange com o possível desabamento da mina de número 18 da Braskem.

A Defesa Civil afirma que três sensores instalados na região apresentam alertas de movimentação. A mina está afundando 1cm por hora, um índice menor do que o apresentado na manhã de sexta —era de 2,6 cm por hora. No total, são 1,43 m acumulados.

Para o geólogo Pedro Cortês, professor da USP (Universidade de São Paulo), a situação é uma "tragédia anunciada" que pode criar uma região fantasma na cidade.

Segundo ele, a gravidade é explicada pelo fato de o minério da região ser altamente solúvel, ao mesmo tempo em que há água dos dois lados: de um, uma lagoa, e do outro, o oceano Atlântico.

"Há décadas, havia um perigo de mineração na área que passava por um processo de urbanização e, mesmo com análises e protestos, nada impediu que continuasse."

Para o prefeito da capital, João Henrique Caldas (PL), o cenário trágico que a região da cidade vive hoje é fruto de uma "exploração predatória e gananciosa" da Braskem na região.

"Estamos vivendo em Maceió desde 2018 uma dor crônica que está sempre presente, fica nos assombrando, e trazendo para todos nós um desafio que vai para além das nossas capacidades", disse em entrevista ao canal GloboNews na tarde desta sexta-feira (1º).

Em nota, a Braskem diz que tem monitorado o local e que dados atuais "demonstram que a acomodação do solo segue concentrada na área dessa mina e que essa acomodação poderá se desenvolver de duas maneiras: um cenário é o de acomodação gradual até a estabilização; o segundo é o de uma possível acomodação abrupta".

A empresa não comentou a fala do prefeito, mas disse que a área atingida está desabitada desde 2020 e que houve a realocação dos moradores de 23 imóveis localizados na área de risco.

Em nota, a prefeitura diz que disponibilizou abrigos para acolher a população de forma emergencial. "Ao mesmo tempo, a prefeitura já solicitou ao governo federal apoio para garantir moradias à população que foi obrigada a deixar suas casas", diz o comunicado.

De acordo com a gestão, 83 pessoas aceitaram ir para os abrigos organizados. São seis escolas municipais e a Casa de Passagem Familiar dispostos, abastecidos com colchões, lençóis, kits de higiene pessoal e alimentação.

Além disso, cerca de 14 bairros tiveram o abastecimento de água afetado na madrugada e manhã desta sexta por conta do iminente colapso da mina, já que a Companhia de Saneamento de Alagoas (Casal) paralisou as atividades na Estação de Tratamento de Água (ETA) Sistema Cardoso. O sistema começou a ser restabelecido por volta das 11h.

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