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Opinião Internacional

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Colunista

José Vicente de Sá Pimentel

O risco de um novo mandato

Coluna foi publicada no domingo (22)

José Vicente de Sá Pimentel | 23/09/2024, 12:33 h | Atualizado em 23/09/2024, 12:33

Imagem ilustrativa da imagem O risco de um novo mandato
Possível segundo mandato de Donald Trump é avaliado como risco à cooperação produtiva e ao convívio pacífico entre os Estados Unidos e outros países |  Foto: J. Scott Applewhite /Associated Press/Estadão Conteúdo

Grande parte do mundo ocidental compartilha o sentimento de que o estado do mundo piora a cada ano. Há fios descobertos para todo lado e ninguém consegue botar ordem na casa. Um número crescente de analistas políticos entende que, para evitar uma nova guerra de proporções mundiais e manter um razoável nível de cooperação produtiva, é preciso que um país ou grupo de países assuma a liderança e restabeleça a primazia dos princípios e valores que preservem o convívio pacífico entre as nações.

Tal avaliação aumenta o receio, a meu ver justificado, de que um segundo mandato de Donald Trump só vai piorar as coisas. Trump é imprevisível, incontrolável, é difícil confiar no que ele diz. Embora afirme, por exemplo, que sequer conhece o Projeto 2015 da Fundação Heritage, o fato é que os autores desse verdadeiro manual de destruição da democracia americana faziam parte da assessoria direta do ex-presidente de 2017 a 2021. Acresce que o próprio Trump, em vídeos que circulam na internet, declara a intenção de ser ditador no primeiro dia do segundo mandato, e “dar um jeito tão bem dado” que os eleitores não precisariam nunca mais preocupar-se com eleições.

O receio generalizado é de que Trump acabe com a OTAN e procure encontrar um modus vivendi diretamente com a China e a Rússia. Em sua concepção, a América isolada seria mais forte e mais rica.

Na verdade, o isolacionismo não é uma novidade, era de fato a tônica na política americana até a Primeira Guerra Mundial. Satisfaziam todo tipo de freguês. Para os realistas, a posição geográfica do país ditava, como corolário, a conveniência de isolar- para proteger os interesses estratégicos do país. Para os idealistas, o isolacionismo dirigiria investimentos para o bem-estar econômico interno, ao invés de desperdiçá-los com guerras onerosas. Para nacionalistas e conservadores, a imposição unilateral do poder americano exigia manter-se distância de pressões de fora. Os liberais preferiam ficar isolados para manter o governo tão pequeno quanto possível. Os puristas, ou racistas, alegavam que o isolamento seria a forma natural de preservar a homogeneidade social e cultural. Para os homens de negócios, o isolacionismo se confundia com o protecionismo, impedindo a entrada de importações.

Se os japoneses não tivessem atacado Pearl Harbor, os isolacionistas do America First Committee, baluarte da campanha contra a participação americana na Segunda Guerra, poderiam ter prevalecido. A história foi outra, porém. O pós-guerra tornou-se o palco da ascensão americana, o que lhe trouxe muito progresso, ao lado da responsabilidade de trabalhar, em conjunto com os demais centros do poder mundial, em prol da paz e da segurança internacionais. Desde 1945, o país encontra-se em primeiro lugar no ranking mundial de riqueza per capita.

Mas a natureza humana supervaloriza a sensação de perda e é disso que certas regiões dos EUA se ressentem. A evolução tecnológica acabou com muito empregos, a globalização inundou com importações um mercado até ali garantido, o aquecimento global coloca progressivamente em cheque a indústria baseada em carvão e petróleo.

A campanha de Kamala Harris sabe que seu êxito depende de uma abordagem convincente desses três grandes fenômenos. Algum sistema de controle das fronteiras terá de ser posto em prática, subsídios financeiros para criar pequenos negócios e subsidiar alunos universitários precisarão ser ampliados, incentivos ao desenvolvimento de energias limpas terão de coexistir por mais algum tempo com os impactos ambientais da extração de óleo e gás.

As ideias de Trump para “fazer a América grande de novo” nunca são explicitadas, a não ser, possivelmente, no Projeto 2025. Com seu imenso ego, ele parece convencido de que tem poderes sobrenaturais – e seus seguidores acreditam nisso. De certa maneira, as políticas mais conservadoras são as defendidas pelo Partido Democrata. Kamala é aquela que segue a rota apregoada por Lampedusa em “Il Leopardo”: tudo deve mudar, para que permaneça o mesmo.

Imagem ilustrativa da imagem O risco de um novo mandato
José Vicente de Sá Pimentel é embaixador aposentado |  Foto: Divulgação

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