Incertezas marcantes
Coluna foi publicada no domingo (02)
Dois acontecimentos dignos de nota marcaram a política internacional na última semana de maio. O primeiro foi a remoção do embaixador Frederico Meyer da embaixada em Telavive para nossa missão junto à Conferência do Desarmamento, em Genebra. Por coincidência, ou não, a portaria da remoção foi publicada quarta-feira (29), um dia após o reconhecimento do Estado Palestino pela Espanha, Irlanda e Noruega. O segundo acontecimento notável foi a condenação de Donald Trump por júri popular, em Nova Iorque, por fraude fiscal e falsificação de documentos contábeis para ocultar um escândalo sexual que poderia prejudicar sua campanha presidencial em 2016.
Nota à imprensa divulgada pelo Itamaraty esclareceu que “a eventual designação de novo embaixador do Brasil em Israel será oportunamente divulgada”.
O tom casual revela mais do que encobre a insatisfação da Chancelaria brasileira com a atitude do governo israelense. Não há pressa para designar nosso novo representante em Telavive; ou seja, a embaixada ficará sob os cuidados de um Encarregado de Negócios, de hierarquia inferior, que vai tocar o expediente sem maior preocupação com as atividades de representação do país.
Há pouco que Israel possa fazer em revide, a não ser levar de volta seu embaixador em Brasília. Caso o faça, Daniel Zonshine provavelmente agradecerá a gentileza. Segundo consta, ele tem um círculo reduzido de contatos junto ao governo e à sociedade local, circula somente entre os grupos bolsonaristas. Graças a isso, conseguiu organizar a visita de dois governadores – a meu ver, muito mal assessorados neste episódio -- que foram a Telavive para tirar fotografias ao lado de Netanyahu.
Ignoradas pelos governadores, a política interna israelense continua tumultuada, e a externa está pior ainda. A natureza extremista da coalizão que apoia Netanyahu restringe sua capacidade de imprimir qualquer mudança de rumo no plano doméstico, e o limita, no plano externo, a pedir desculpas pelos “erros graves” cometidos nos bombardeios, condenados por um número cada vez maior de países.
A erosão da democracia em Israel e a inflexibilidade de seus generais reverberam nos Estados Unidos e mesmo no New York Times já se publicam artigos discutindo a conveniência da manutenção da ajuda militar ao governo israelense. Os recentes protestos em universidades americanas a favor de um cessar-fogo imediato na Faixa de Gaza não podem deixar de sensibilizar os organizadores da campanha para a reeleição do presidente Biden, uma vez que os jovens universitários são tradicionalmente um celeiro de eleitores do Partido Democrata.
Aliás, a campanha presidencial foi impactada pelo veredito anunciado na quinta-feira (30), pelo júri novaiorquino. Não há dúvida de que uma nova fase da campanha começou.
O que mais impressiona é a unanimidade com que os 12 jurados consideraram Trump culpado em todas as 34 acusações de fraude. Veredito tão categórico pode inclusive convencer o juiz a aplicar a pena de prisão ao ex-presidente.
Seguindo os ritos da justiça de Nova Iorque, a sentença só será anunciada em 11 de julho próximo, quatro dias antes da convenção em que o Partido Republicano escolherá o seu candidato às eleições de 5 de novembro vindouro.
Trump tem o partido na mão, por isso ninguém tem dúvida de que será confirmado como o candidato republicano. Como havíamos comentado na coluna de domingo passado, a lei americana não impede que, mesmo na prisão, ele seja eleito.
O que não se sabe é como isso aconteceria na prática, pois nunca houve na história americana um presidente condenado criminalmente. Já imaginou um presidente andando no Oval Office com caneleira eletrônica? As incógnitas são muitas. O certo é que o mundo inteiro aguarda ansioso os próximos capítulos dessa histórica eleição.