Fundo do poço
Coluna foi publicada nesta quinta-feira (08)
Cada um tem o seu fundo de poço e só quem sabe qual é o seu somos nós mesmos. Eu sei que você já parou e olhou para uma situação que um amigo, parente, conhecido e até desconhecido passa ou passou e se perguntou: “Como esta pessoa aguenta?!”. Quer a resposta? Ela aguenta porque ainda vê um sentido naquilo, que você talvez não veja.
Mas Sátina, você está incentivando as pessoas a permanecerem em situações ruins? Não! Eu só estou dizendo que cada um de nós vê a vida, ou o que se vive, com o repertório que adquiriu durante ela.
No ano de 2020, fizemos uma pesquisa com mulheres do Espírito Santo, buscando averiguar se elas estavam em relacionamentos abusivos e se tinham consciência disto.
Apresentamos frases que são vistas de forma constante nestes relacionamentos, e depois questionamos se estas estavam ou estiveram presentes no seu dia a dia. A maioria das respostas foi que sim, elas estavam.
Descobrimos, então, que muitas das mulheres entrevistadas não se reconheciam em um relacionamento tóxico e que, durante a pesquisa, quando nós apresentamos as frases, é que se reconheceram nele (algumas nem com isso).
Portanto, há coisas que precisamos de ajuda para enxergar, pois podemos estar tão aninhados ao momento, história ou pessoa que acabamos criando uma realidade paralela (ou, como chamamos na psicologia, de subjetiva) e nos afundamos nela sem a intenção de sair, porque não temos compreensão para isto.
No ALANON (Grupo de Familiares dos Alcoólicos Anônimos), ensinam que não podemos intervir nas consequências do abuso do consumo de álcool dos nossos “protegidos”.
Se vomitar ou urinar nas roupas - não limpe; se cair - não levante (só se estiver machucado), e por aí vai.
No início, quando li sobre isto, achei muito estranho. O meu sentido de proteção para com os meus gritou: “Tá doido, vou deixar dormir no chão frio?!”.
Depois eu entendi - vou sim! Porque se eu intervenho, eu mudo a realidade do outro e ele não conseguirá enxergar, de verdade, onde está e onde pode vir a parar com suas decisões.
Quando alguém chega ao fundo do seu poço, ou ele fica por lá ou começa a buscar a luz, olhando para cima. A terapia pode ser o primeiro degrau dessa segunda opção.
Como psicóloga e uma auxiliar do processo de autoconhecimento do meu cliente/paciente, posso afirmar que, pelo acompanhamento terapêutico, podemos, juntos, ressignificar o fundo do poço.
Podemos inclusive, depois de tê-lo ultrapassado, nos tornarmos experts nos motivos que nos levaram até lá e, assim, os evitarmos no nosso cotidiano.
Acabamos aprendendo os nossos limites para certas situações e isto é incrivel, pois podemos chegar na beirada do poço e dizer: “Já sei o que tem aí e não quero mais! Tchau!”. Na verdade posso até me recusar a chegar na beirada.
Então, minha proposta é: conheça-se! Busque compreender o que te faz descer cada degrau e questione-se: “Será que isso realmente vale a pena?”. Já te adianto... se está se sentindo descendo e não subindo... não vale!