Cada um vê o mundo com os óculos que tem
Coluna foi publicada nesta quinta-feira (11)
Quando vamos aos médicos oftalmologistas, eles nos colocam naquela cadeira que parece um assento de nave espacial, pingam um líquido nos nossos olhos e apresentam letras e figuras e perguntam: “O que você vê? Como você enxerga o que está à sua frente?”.
A partir daí, de maneira bem singular, recebemos o nosso diagnóstico e o grau de nossos óculos para vermos melhor o mundo. Isso é muito importante, pois no dia a dia é assim que vivemos. Percebemos o mundo da maneira com a qual o enxergamos! Ou seja, da forma moldada com as nossas experiências, a partir daquilo que vivemos e daquilo que somos.
Vou lhe contar uma história real. Já fui psicóloga de população de rua no município de Vitória, porém, em uma certa feita, houve um desabamento de terras devido à chuva em uma comunidade. E os profissionais da população de rua foram acionados para auxiliar a Defesa Civil. Muitos tiveram que sair de suas casas, mas muitos resolveram ficar por lá, ou para “defender” o pouco que tinham ou por não ter para onde ir.
Eu, com minha fiel companheira Renata Lopes (assistente social), fui designada a fazer o atendimento de uma senhora para tentar convencê-la a sair, pois era muito perigoso permanecer no local. Quando chegamos, ela nos cumprimentou com a seguinte frase: “Bem-vindas à minha casa!”.
Olhamos uma para a outra e pensamos (sim, nós pensávamos muito juntas): “Que casa?!” Afinal, era apenas um monte de papelão. Porém, veja, para aquela senhora, aquela era a casa dela.
Por mais que eu e minha companheira de batalha achássemos que o significado de casa era uma estrutura feita de tijolos, telhado, janelas, porta, banheiro etc, aquela era a percepção de “casa” que ela podia ter. Fomos muito gratas por poder viver a casa que percebemos.
A Gestalt é uma grande vertente da psicologia que fala sobre a percepção e como nossa subjetividade acaba por influenciar na maneira como percebemos o mundo.
A máxima da Gestalt é que “a soma das partes é diferente do todo”. Então, quando olhamos algo, precisamos esmiuçá-lo de certa forma, pois ele pode ser mais do que aquilo que podemos ver.
Ela ainda nos ensina que no dia a dia existem diversos princípios que usamos para criar o nosso mundo perceptivo. Você provavelmente já viu pela internet umas figuras que as pessoas percebem de forma diferente. Se não, pesquise aí: “Gestalt imagem velha ou moça”.
Você vai adorar! Portanto, quando olhamos o Outro, podemos até usar os nossos óculos, mas precisando entender que o mundo do Outro é dele e não meu.
Podemos, sim, compartilhá-lo, às vezes de maneira natural ou às vezes esforçando-nos um pouco (dê uma espremida nos olhos aí), mas não podemos obrigá-lo a enxergar como enxergamos, ou a pensar como pensamos.
Mas aí cada um vê do jeito que vê e pronto!? Não! Se você usa óculos, talvez já precisou trocá-los por ficarem obsoletos às suas novas necessidades, ou ainda, pode ter decidido fazer uma cirurgia para mudar totalmente a forma como vê a vida.
É isso! Podemos ir mudando o jeito que percebemos a vida, a partir de novas lentes (compradas ou emprestadas) ou a partir da revolução do autoconhecimento.