Stellantis quer vender carros híbridos no hemisfério Sul
Estratégia do grupo seria ter uma alternativa aos carros elétricos
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O grupo Stellantis, multinacional que controla as marcas Fiat, Jeep, Peugeot, Citroën e RAM, aposta nos carros híbridos como alternativa aos veículos elétricos no hemisfério Sul, com destaque para o Brasil.
A estratégia da empresa considera que países em desenvolvimento terão mais dificuldades para eletrificar suas frotas e que, por isso, permanecerão com carros movidos a combustão --no caso, o etanol.
O plano, se assim posto em prática, aumentaria a produção de carros híbridos no mundo, o que colocaria o Brasil como um importante fornecedor de combustível no mercado internacional.
O país é o segundo maior produtor de etanol do mundo, atrás dos Estados Unidos. Há ainda a possibilidade de a produção crescer em países como a Índia, que também desenvolve um programa para veículos movidos a combustíveis renováveis.
Hoje, especialistas questionam se a indústria automotiva teria condições de manter a fabricação de carros híbridos apenas no Brasil, enquanto eletrificam suas rotas no restante do mundo. Um plano como o da Stellantis, porém, modificaria o cenário.
A Fiat foi pioneira ao lançar o primeiro carro a etanol do Brasil. Foi o modelo compacto 147, em 1979. Agora, a empresa tem pronto um motor que pode conciliar somente o derivado da cana à eletricidade. Isso resultaria em números menores de consumo e de emissão de poluentes, já que não seria necessário fazer uma calibração intermediária para o uso da gasolina.
"A necessidade de descarbonização está gerando uma diferente demanda tecnológica dependendo da região, e outros mercados vão precisar do carro híbrido a etanol, como a Índia", disse João Irineu Medeiros, vice-presidente de assuntos regulatórios da Stellantis na América do Sul à Folha.
"Países que estão no hemisfério Sul e precisam descarbonizar de forma equilibrada, de forma economicamente sustentável, vão precisar dessa solução."
O executivo participou do Fórum Nordeste, organizado pela indústria sucroenergética de Pernambuco, em Recife, nesta segunda-feira (2). No evento, representantes do setor defenderam que o governo brasileiro seja mais agressivo na oferta de etanol a outros países --com o Brasil presidindo, neste ano, o G20 e, no ano que vem, a COP30 (Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, em 2025), esse seria um bom momento.
Para Medeiros, o desafio atual da indústria automobilística é descarbonizar a produção de automóveis sem encarecê-los. A Stellantis defende que eletrificar as frotas em países em desenvolvimento elevaria os custos dos carros, o que poderia reduzir as vendas de modelos zero-quilômetro.
"É necessário ter infraestrutura de recarga, produzir a bateria e produzir a célula da bateria, e isso custa caro e leva tempo. Quem vai financiar a infraestrutura de recarga no Brasil? O governo? Nós? Se eu já tenho o etanol que descarboniza tanto, por que tenho que financiar uma infraestrutura de recarga? Precisamos pensar na balança", afirmou o representante da Stellantis.
De acordo com dados da apresentados por Medeiros no Fórum Nordeste e levantados pela Stellantis, carros movidos a apenas etanol emitem uma média de 26 toneladas de CO2 em todo o seu ciclo de vida, considerando os insumos necessários para a sua produção e o descarte (conceito do berço ao túmulo).
Já um veículo 100% elétrico no Brasil emitiria 23 toneladas de CO2 com base na mesma medição. Nos países em que a matriz energética é mais suja, as emissões são maiores.
Essa comparação seria vantajosa para o carro movido a etanol se fossem considerados os futuros veículos híbridos abastecidos com o combustível de origem renovável, segundo a Stellantis.
"Podemos usar o etanol, porque descarbonizaremos tanto quanto o elétrico. E se eu pegar o etanol e combinar ele com diferentes níveis de hibridização, eu reduzo o valor de CO2 ainda mais do que o elétrico", disse Medeiros.
O levantamento da Stellantis aponta que a maior parte (68%) das emissões dos carros movidos a etanol vem da queima do combustível, justamente durante o uso do veículo. Já no caso dos elétricos, a maioria das emissões vem do processo de fabricação das baterias, principalmente da extração de minerais estratégicos, como lítio e níquel.
"Temos que avaliar do berço ao túmulo. Eu não posso avaliar só um pedacinho do processo, tenho que avaliar o ciclo de vida completo do carro, senão estou sendo injusto e vou ser induzido a conclusões que são parciais", afirma Medeiros.
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