Implante para tratar depressão é usado pela 1ª vez no País
O procedimento ativa o nervo vago, que envia sinais elétricos ao cérebro, afetando as áreas que são associadas ao humor
Escute essa reportagem
Pacientes com depressão resistente estão tendo a oportunidade de fazer um novo tratamento por meio de implante de um aparelho no nervo vago (nervo que transmite mensagens entre o cérebro e outras partes do corpo), na região do pescoço.
A técnica já era usada para tratar pacientes com crises epilépticas, mas, recentemente, foi usada, pela primeira vez no País, em dois pacientes com depressão refratária em Florianópolis, Santa Catarina.
Segundo especialistas, o implante ativa o nervo vago, que envia sinais elétricos ao cérebro, afetando os neurotransmissores e as áreas cerebrais associadas ao humor. O tratamento tem liberação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
O neurocirurgião funcional André Bissoli explica que o nervo vago, sendo um dos nervos que saem do cérebro, tem diversas funções no organismo, como controlar batimentos cardíacos, movimentos do intestino e regular a pressão.
“Ele é como se fosse uma ramificação, se ligando a vários sistemas diferentes dentro do cérebro, dentre eles o circuito que comanda a parte do humor. Os pesquisadores começaram a perceber, nos tratamentos de estimulação do nervo vago para outras doenças, que o sintoma depressivo também ia melhorando. A partir daí, começou-se a investigar o tratamento de depressão pelo nervo vago”.
O neurocirurgião Walter Fagundes, PHD em neurocirurgia e professor da Universidade Federal do Espírito Santo, explica que a neuromodulação do nervo vago, por meio de eletrodos, estimula ou inibe a região.
Ele destaca ainda que a estimulação também já é feita no cérebro para tratamento de Parkinson, TOC, agressividade e depressão.
“O procedimento no cérebro é mais invasivo e tem um risco maior do que colocar um eletrodo no nervo vago”.
O médico já operou mais de 18 pacientes no Brasil e exterior implantando eletrodos para a estimulação do nervo vago para tratamento de epilepsia. Segundo Walter, para receber o tratamento para depressão há uma série de requisitos.
“Nos pacientes que não melhoram com outros tratamentos, a neuromodulação do nervo vago melhora, segundo os estudos, em até 70% dos que são submetidos a essa técnica. É mais um avanço da ciência para amenizar a dor desses pacientes”, observa.
Opiniões
Doença vai ser a mais comum do mundo em 2030, diz OMS
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a depressão deverá ser a doença mais comum do mundo em 2030.
O transtorno atinge aproximadamente 13% da população, correspondendo a 505 mil pessoas no Estado.
Após a pandemia, a prevalência da doença tem aumentado, segundo o psiquiatra Anderson Dondoni Lovatti. “A rotina de trabalho rígida, a autocobrança, a busca pelo resultado e sucesso incessante têm deixado as pessoas vulneráveis ao aparecimento dos transtornos mentais”.
Anderson frisa que a incidência da doença tem preocupado a classe médica pelo agravamento dos sintomas, cada vez mais intensos.
“Sabe-se que a depressão não tem uma causa definida, sendo multifatorial. Genética, histórico familiar de depressão, questões ambientais, sedentarismo, estresse crônico e dieta desbalanceada podem causar a doença”, explica.
O médico ressalta que manter um estilo de vida saudável pode combater o aparecimento dos sintomas da depressão.
Fique por dentro
Recuperação total em 40% dos pacientes
Tratamento para depressão
Dois pacientes receberam implantes de um aparelho de estimulação do nervo vago para tratar depressão resistente na semana passada, em Florianópolis, Santa Catarina.
É a primeira vez no Brasil que a técnica é usada para o tratamento de depressão.
Antes, o implante era realizado no nervo vago em pacientes com crises epilépticas.
Para que um paciente seja elegível para o implante, é necessário que receba uma recomendação por parte de um psiquiatra e seja encaminhado a um neurocirurgião familiarizado com a tecnologia, podendo passar por outros profissionais.
o tratamento para depressão ainda é considerado recente e não é oferecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS) nem pelos planos de saúde.
Estudos
Testes clínicos feitos com 795 pacientes em cinco anos nos Estados Unidos indicaram melhora significativa da depressão refratária em aproximadamente 70% dos envolvidos, além da recuperação completa de aproximadamente 40% dos pacientes.
Nervo vago
É um dos nervos que saem do cérebro e tem diversas funções no organismo, como controlar batimentos cardíacos, movimentos do intestino e regular a pressão. O neurocirurgião funcional André Bissoli explica que o nervo vago é como se fosse uma ramificação, se ligando a vários sistemas diferentes dentro do cérebro, dentre eles o circuito que comanda a parte do humor.
Estudos sugerem que a estimulação do nervo vago pode modular redes neurais desequilibradas na depressão, contribuindo para a melhoria dos sintomas.
Como funciona a cirurgia
O paciente fica sob anestesia geral durante o procedimento e é esperado que receba alta no mesmo dia.
Na cirurgia, uma incisão é feita para implantar o aparelho estimulador sob a pele abaixo da clavícula esquerda ou próximo da axila esquerda.
Na sequência, uma segunda incisão é realizada no pescoço para fixar três pequenos eletrodos ao nervo vago esquerdo, e esses eletrodos são ligados ao gerador por um condutor sob a pele.
Em média, a cirurgia pode variar de duas até quatro horas.
A forma como o aparelho estimulador é implantado se assemelha muito a do popular marca-passo.
Controle do aparelho
O neurocirurgião Walter Fagundes explica que o controle do eletrodo é feito por wi-fi, sendo feito o ajuste dos parâmetros de estimulação para o nervo até obter o melhor resultado em relação à depressão, sem efeitos adversos.
Ao estimular o nervo pode ocorrer um pouco de tosse e soluço. Isso precisa ser ajustado até conseguir o melhor resultado sem efeitos colaterais.
Riscos
O neurocirurgião Walter Fagundes explica que a cirurgia é de baixo risco de complicação, sendo a infecção o principal problema associado ao procedimento.
Tempo de validade
O tempo de validade do aparelho, segundo o neurocirurgião Walter Fagundes, é o tempo da bateria. Isso depende do estímulo dado ao aparelho. Se o estímulo não for muito alto pode durar até seis anos. Quando houver necessidade de troca, troca-se apenas a bateria e não o eletrodo.
O dispositivo não impede o paciente de iniciar novos tratamentos, como o uso de medicação ou psicoterapia.
Comentários